Vou a nado



Gosto de nadar. É como quando era pequenina: tenho ondas a fazer de pai grande a pegar-me ao colo; tenho um nariz que não deixa entrar água a imitar o mano cuidadoso e protetor; tenho a areia sempre lá para mim como se, de repente, fosse mãe; tenho os peixinhos que não conheço de lado nenhum a serem os amigos que conhecia quando ia aos baloiços voar; tenho o sabor a sal a fingir que é a avó quando obrigava a comer a sopa e tenho a boca cheia de ar com a mania que é o bolo de aniversário.
O meu pai dizia-me que era uma sereia porque nasci ao pé do mar, e eu acreditava. Só me faltava a cauda. As conchas roubava-as à areia e os braços para nadar deu-me a barriga da mãe. Sempre gostei do mar e sempre gostei de nadar. E gosto e nado. 
Nunca fiquei de mão dada ao pai, de pé, a olhar com medo para a transparência das águas. Qual quê! Atirava-me e nadava e só queria nadar porque o meu pai dizia que era sereia e eu acreditava. O mano nadava primeiro e eu olhava mas depois queria ir também. E ia e nadava muito. Naquela altura ainda não sabia que as ondas faziam de pai e que o sal era a avó. Naquela altura nadava sem pensar mas agora quando nado penso e sei que o mar é a minha família e é como quando era pequenina. E em pequena era livre, nadava pela vida fora livre. Agora não estou livre, só quando nado. Deixei de ser sereia sempre para passar a ser às vezes e essas vezes são quando nado no mar. Sou sereia porque o meu pai disse-me e eu acreditei e ainda acredito. 

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