perfeitamente imperfeita


Conhecia-lhe tão bem os traços. Os olhos amendoados, o cabelo frisado e negro, os lábios algo grossos e carnudos. Porque chorava?
Não era perfeita. E ela sabia-o, sabia até que ninguém o é… Que a perfeição não existe. No entanto, abominava o seu aspecto. A sua estrutura, a sua altura. Gostava dos seus olhos e do seu cabelo. De resto… muitas eram as falhas, os defeitos, detestava, odiava, desprezava. Achava completamente ridículo e injusto. Não entendia o porquê, mas rebaixava-se tanto, sem o ter que fazer. Sentia que todos os elogios eram conversa de circunstância e feitos por simpatia apenas. Não acreditava quando lho diziam. Quando lhe diziam que era linda. Muitas vezes, fazia um esgar no seu interior. Não era verdade! Via-o…
Era por isto que chorava. Era por isto que os seus olhos grandes estavam repletos de lágrimas presas, que a sua garganta se encontrava entupida. Era por isso que lhe doía o peito e tinha um nó no estômago…
Foi então, ainda que por o que lhe pareceu uma milésima de segundo, sorriu. Sorriu por observar os seus olhos gigantes e em formato de amêndoa a abrirem-se. Pestanejou tão graciosamente que tornou a sorrir. O seu sorriso era de longe perfeito, mas oh como era querido e contagiante… passou a língua pelos lábios e observou a sua tonalidade. Carnudos, tão chamativos, tão sensuais, tão apetecíveis. Trincou-os ao de leve e o tal pequeno gesto pareceu-lhe tão sedutor.
Riu-se. O som do seu riso era algo infantil. Agradava-lhe. Um som puro e alegre.
Com um olhar meticuloso, observou todos os seus caracóis e o brilho que neles estava embutido pela luz, um pouco fraca, da casa de banho. Como se fascinada com aquele momento que nunca parecia acabar, perdeu-se no seu olhar e afastou-se, pé ante pé, muito devagarinho, sem nunca desviar os seus olhos do olhar cortante que via, para trás. Observou as suas curvas ao longo do corpo, as suas clavículas tão delineadas e o seu pescoço tentador. Fechou os olhos e voltou a abri-los. Perguntou-se porquê. Porque te odeias?
Tudo desabou outra vez. Tudo o que antes achara bonito, agora tornara a difamar. Abriu os lábios com um semblante de desagrado. Uma lágrima quente da raiva que se criava dentro dela escorreu-lhe pelo rosto até ao queixo.
Olhou-se chocada. Olhou para o espelho, estática. Não gostava de pensar assim, não gostava do que se tinha tornado.
Cerrou os lábios e fechou os olhos com força. Embrenhou as unhas na palma da mão quando fechou com ardor o punho e, muito repentinamente, abriu os olhos e dum modo insonoro, gesticulou “Não sejas estúpida, por favor. A tua estupidez está a matar-me…”

15-12-2011


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